Bustamante comentou que o potencial democratizante da informação na internet foi comprovado por uma pesquisa realizada na Espanha. A web contrapõe-se ao domínio das grandes redes e tem enorme potencial de intercâmbio horizontal. O professor de Filosofia Renato Janine Ribeiro (Universidade de São Paulo) acredita que “a internet é interessante para criar novos laços sociais. Esse tipo de vínculo sempre é forte”. Fernando Kuhn (Universidade Metodista de São Paulo) revelou apenas 35,6% dos usuários da internet falam inglês: “Temos cerca de 1.000 idiomas presentes na rede.”
No Brasil, outras alternativas, como as emissoras comunitárias, ainda não alcançaram penetração semelhante às de outros países. As TVs comunitárias, pela lei, só podem operar dentro do sistema a cabo – logo, atingirão no máximo os 7% da população que assina o serviço (na Argentina, esse número chega a 57%). Mas a audiência real das TVs comunitárias sem dúvida não chega perto desses 12 milhões de pessoas, quase todos das classes mais abastadas da população e com um padrão de exigência estética infelizmente distante do permitido pelos escassos recursos das associações comunitárias que obtêm canais. Curiosamente, a mesma lei que criou os canais comunitários “esqueceu” de lhe destinar parte da renda com a assinatura da TV a cabo…
O modelo de rádio comercial no Brasil não favorece a circulação democrática da comunicação. Conforme estudo de Sônia Virgínia Moreira citado por Gisele Sayeg Ferreira (Universidade de São Paulo), existiam no país em 1999 três mil emissoras de rádio, das quais 1.350 (45%) pertenciam a políticos, 750 (25%) a igrejas evangélicas, 300 (10%) a igrejas católicas e apenas 600 (20%) a empresários de comunicação. Em função desse quadro, que é histórico, lutou-se por vinte anos pela legalização das rádios livres no Brasil como uma esperança de democratização dos meios. A regulamentação veio em 1998, mas a realidade ainda está longe do sonhado. Gisele vem pesquisando 22 rádios comunitárias legalizadas da região Noroeste do Estado de São Paulo, onde identifica a reprodução do modelo de transmissão unilateral das grandes redes:
– Essas rádios são vistas como uma oportunidade de investimento para pequenos empresários, que têm vínculos estreitos com as forças políticas, econômicas ou religiosas locais.
Situação semelhante foi identificada por Lúcia Lamounier Sena e Jaqueline Morelo (Centro Universitário Newton Paiva) em rádios comunitárias de Belo Horizonte. De 9 emissoras pesquisadas (nenhuma delas legalizada), apenas 2 podem ser classificadas como realmente comunitárias, tendo origem em associações de bairro ou entidades religiosas; as outras são classificadas como personalistas – ou seja, pertencentes a indivíduos que, por interesse financeiro, conhecimento técnico, vontade ou apenas curiosidade, resolvem criar suas rádios.
– Essa situação mantém a tradição brasileira em considerar os direitos individuais como uma dádiva dos detentores do poder – opina Lúcia.
No meio impresso, uma interessante experiência de jornalismo comunitário vem sendo realizada por Rosana Cabral Zucolo e Ana Cristina Spannenberg, da Faculdade Social da Bahia, junto ao Corte Grande, uma área de ocupação no bairro de Ondina, Salvador. A Faculdade procurou em 2002 três comunidades do Corte – Alto de Ondina, Baixa da Alegria e Pedra da Sereia -, apresentando a idéia de publicar jornais-laboratório feitos pelos alunos de Jornalismo nos quais os moradores pudessem se expressar. Os assuntos a serem abordados nos jornais são sugeridos pelos moradores e debatidos com toda a comunidade, de forma a realmente refletir sua visão de mundo. Inicialmente, foram criados dois veículos, Comunidade Alegria (para a Baixa da Alegria) e Visão do Alto (Alto de Ondina); como se constatou que as pautas e as reivindicações dos dois grupos eram semelhantes, os próprios moradores optaram pela unificação da proposta no Visão do Alto. Em sua edição nº 2 (dezembro de 2003), na matéria Pesquisa revela a comunidade – Quem é e o que pensa o morador do Alto de Ondina? Pesquisa feita pelos estudantes revela o perfil da população que vive no bairro, de Ana Lucia Arouca e Ingrid Carmo, a rodomoça Fabiana Santos Batista elogiava a forma de elaboração da pauta:
– É muito importante sugerir os assuntos que nós queremos ler no jornal, porque somos nós que passamos pelos problemas. E quem convive aqui na comunidade sabe mais a fundo que tipos de problemas são esses.
Infelizmente, a produção do veículo vem enfrentando problemas. Autoridades e representantes de empresas concessionárias de serviços públicos, muitas vezes, deixam de atender os alunos-repórteres por não serem da grande imprensa. Em função disso, o lúcido editorial da edição nº 3 do Visão, intitulado Quem Impede que a Informação Chegue Até Você?, encerra com essa reflexão:
“Esse não é um problema para ser pensado, nem uma cobrança para ser feita apenas por quem é estudante de Comunicação: será que você está sabendo tudo o que é importante como cidadão? Se não está, quem não permite que a informação chegue até você?“